sobre evan dando, máscaras e interpretação de texto

postei ontem nos stories esse vídeo do evan dando, vocalista do lemonheads, banda indie hit dos anos 90, num mercado, mandando uma versão acústica da fofa canção confetti, todo lindo de calça skinny manchada, vans de oncinha e agasalho tipo boneco michelin.⠀

das respostas que recebi, que não foram muitas (posto que no auge do seu sucesso, lá nos anos 90, o evan dando já era relativamente obscuro, que dirá em plena pandemia de 2021), 90% falava da máscara abaixada.⠀

obviamente ele não devia ter abaixado a máscara - não tô celebrando o não-usar máscara, ainda mais num país como esse - e obviamente não foi a máscara abaixada que me fez compartilhar o vídeo.⠀

posto a obviedade do erro que é a falta da máscara - que, sendo óbvio, não achei que necessitava comentário - me resta a questão: por onde anda a habilidade do ser humano de enxergar camadas de interpretação num dado texto, seja ele escrito ou imagético? cadê pensamento abstrato que permite enxergar significados em imagens e textos que funcionam - usando uma palavra que odeio, mas na falta de outra - universalmente, independente do tempo e sociedade em que estamos?⠀

a mim me parece óbvio (mas, claro, talvez não seja) que minha celebração efêmera nos stories não se deu porque eu estava feliz de ver alguém sem máscara - e sim porque estava feliz de ver um ídolo relativamente invisível nas redes sociais, um ícone pop-alternativo de uma década, tão singelamente cantando uma serenada pro funcionário do mercado que guardou a carteira que ele tinha perdido.⠀

é impossível, pro nosso mundo atual, enxergar qualquer coisa que funcione fora da situação em que estamos devidamente vivendo no aqui e agora? não existe o permitir se encantar, mesmo que algumas coisas estejam indevidamente fora do lugar?⠀

não existe o entender que, em qualquer era da história, encontrar seu ídolo num mercadinho tocando violão é digno de encantamento? ⠀

dá pra se encantar e empatizar antes, pontuar a falta da máscara depois?⠀

blé, preguiça dessa rede