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joni mitchell: a cantora mais punk do folk

  • Foto do escritor: melody erlea
    melody erlea
  • 10 de abr. de 2023
  • 4 min de leitura

em 1997, a rolling stone convidou o morrissey para entrevistar a joni mitchel - a 1a pergunta que o cínico rapaz fez foi: joni, é verdade que a rolling stone disse que seu disco de 1975, the hissing of summer lawns, foi o pior disco daquele ano? é verdade que a rolling stone publicou um diagrama de todas as suas relações amorosas com outros músicos? kkkk a audácia!


morrissey então pergunta sobre os sex pistols, que tinham uma curiosa, inesperada - e recíproca - relação de admiração artística com joni (dá pra imaginar uma coisa dessa?), e joni diz: eu sou uma punk.


e ela não está errada: joni sempre esteve na contramão do mainstream em suas decisões artísticas e sempre esteve meio deslocada esteticamente dos ambientes que frequentava. em sua adolescência em saskatchewan, no canada, ela se destacava de seus colegas por seu estilo autêntico, que ela cultivou desde cedo - e que era muitas vezes imitado pelas outras garotas da escola.


joni mitchell sempre gostou de boas roupas e de demonstrar um certo não-conformismo através de suas escolhas de estilo - na escola, usava a gravata do pai como acessório; algo completamente afrontoso na década de 1950.


em 1967, depois de uma temporada em londres da qual ela voltou completamente twiggyzada - maquiagem marcada com cílios falsos e tudo, roupas moderninhas em alta, tudo montadinho - joni conheceu david crosby, num circuito de shows em pequenos clubes nos quais ela cantou no início da carreira. foi ele que deu o toque: “joni, abre mão dessa pintura de guerra aí no seu rosto, aceita a vibe cara lavada aqui da california”.

mal sabia crosby que essas palavras de incentivo ajudariam a transformar o estilo boho, hippie, feito-em-casa e marginalizado - até então a epítome da chamada anti-moda - em tendência absoluta, que décadas depois segue sendo referência de estilo e história da moda.

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se a yves saint laurent, nos anos 1970, traduziu essa linguagem para as passarelas da alta-costura, foi porque em 1967 joni mitchell havia descoberto a liberdade que era acordar, lavar o rosto… e não precisar fazer mais nada.

é difícil, aqui em 2023, décadas depois do visual boho já ter entrado e saído das tendências dezenas de vezes, pra gente entender o impacto do estilo da joni mitchell na moda e na cultura pop. o woodstock, em 1969, levou as imagens da estética hippie para o mundo todo, mas esse look ainda era considerado completamente avesso ao que os costumes do bom gosto ditavam.


a ideia de sair de casa com os cabelos longos, soltos, naturais esparramados pela cabeça, sem maquiagem, com roupas soltas, confortáveis, sem nenhum apego aos acordos sociais vigentes, o resgate de elementos étnicos e ancestralidades, tudo isso era novo, era absurdo - era anti-moda.


a noção de anti-moda existe há tanto tempo quanto a moda - e por moda eu digo o padrão de normas acordadas informalmente por uma sociedade do que é aceitável vestir ou não. as sufragistas bloomers, que usavam calças no século XIX, são um exemplo de ativistas de anti-moda, assim como as primeiras mulheres a cortarem os cabelos bem curtinhos no início do século XX. todas as estéticas anti-moda acabam sendo cooptadas pelo mercado capitalista de moda, tornando-se parte do ciclo de tendências visuais de produção e demanda.

mas todas elas, por um breve período, são representantes distintas de um movimento de contra-cultura e de um inconsciente coletivo de mudança.


não é à toa que joni mitchell se tornou um dos grandes rostos do estilo boho da década de 1970. mesmo quando joni carregava nas costas a estética visual de uma subcultura inteira, a cantora era um peixe fora d'água em seu próprio meio. nunca satisfeita em se comprometer a um visual, um look, uma estética ou qualquer conjunto de normas inventadas, joni esculpiu seu estilo com todas as ferramentas que suas referências de gostos pessoais lhe forneciam.



sim, havia os símbolos básicos da cultura flower power: jóias turquesa, as saias longas vintage, o cabelo louro emoldurando aquelas maçãs do rosto perfeitamente delineadas pela mãe-natureza, sem um pingo de cosmético pra ajudar. mas também tinha o apreço de joni pela qualidade da alta costura e pela história de certos itens. tinha seu gosto por glamour - paetês, brilho, saltos. o resultado dessa mistura fazia dela uma personagem quase mítica, incompreensível em suas contradições. uma pessoa difícil de lidar pois tão impossível de encaixar nas fórmulas aceitas de como uma mulher devia se portar - mesmo uma mulher que era sabidamente um espírito livre e bohêmio (e genial) como mitchell.


quando ela se apresentou, em 1970, usando um vestido cintilante, foi acusada de estar se tornando glamourosa demais para o rock 'n' roll. na mesma época, ao vê-la com uma clássica bolsa chanel de matelassê, o ator warren beatty a avisou que aquele item era inapropriado pra uma artista da contra-cultura.


a verdade é que joni nunca aceitou abrir mão de sua individualidade e seu poder de escolha para pertencer a clubinho nenhum - ela não usava as roupas que se esperava, não fazia a música que se esperava, e não se portava da maneira que se esperava. bob dylan disse que ela praticamente um homem, e o mesmo david crosby que a ensinou a usar roupa hippie em 1967 depois a chamou de "tão humilde quanto mussolini".


das roupas à atitude ao tipo de música que escolhia fazer, joni mitchell nunca aceitou se coformar a padrões e sempre fez o que quis, independente de tendências de mercado. “eles te crucificam se você permanece igual, mas também te crucificam se você muda. bom, mudar é mais divertido que não mudar”.


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